segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

[A] gnose

     Quando cheguei à maturidade intelectual e comecei a perguntar-me se era ateu, teísta ou panteísta, materialista ou idealista, cristão ou livre-pensador, percebi que quanto mais aprendia e refletia menos fácil era a resposta, até que por fim cheguei à conclusão de que nada tinha a ver com nenhuma dessas definições, com exceção da última. A única coisa em que todas essas excelentes pessoas estavam de acordo era a única coisa em que eu discordava delas. Estavam bastante seguras de que tinham atingido uma certa ‘gnose’ – haviam, com maior ou menor sucesso, resolvido o problema da existência, enquanto eu estava bastante seguro do contrário e possuía uma convicção razoavelmente forte de que o problema era insolúvel. [...] Portanto, meditei e inventei o que me parece ser um rótulo adequado: ‘agnóstico’. Pensei nele como uma antítese sugestiva dos gnósticos da história da Igreja, que professavam conhecer coisas em que eu era ignorante.

[Henry Huxley – biólogo; 'inventor' do termo agnóstico em meados do século XIX; avô de Aldous Huxley, escritor]


quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

Um poema bonito...

Compartilho um belo poema que fala muito sobre meu espírito, e, faço fé, sobre os de muitos outros...


ELEVAÇÃO
Charles Baudelaire

Por sobre os pantanais, os vales orvalhados,
Por sobre o éter e o mar, por sobre o bosque e o monte,
E muito além dos confins dos tetos estrelados,

Meu espírito, vais, com toda a agilidade,
Como um bom nadador deleitado na onda,
Sulcas alegremente a imensidão redonda,
Levado por indizível voluptuosidade.

Bem longe deves voar destes miasmas tão baços;
Vai te purificar por um ar superior,
E bebe, como um puro e divino licor,
O claro fogo que enche os límpidos espaços.

E por trás do pesar e dos tédios terrenos
Que gravam de seu peso a existência dolorosa,
Feliz este que pode de asa vigorosa
Lançar-se para os céus lúcidos e serenos!

Aquele cujo pensar, como a andorinha veloz
Rumo ao céu da manhã em vôo ascencional,
Que plana sobre a vida a entender afinal
A linguagem da flor e da matéria sem voz.

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quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Enter

Paradoxo é logar pra dizer que vai se afastar da internet. Toda a satisfação que negamos ferrenhamente durante anos de rebeldia aos nossos pais e familiares, hoje damos à internet. Muitas vezes, ela (a internet) sabe mais sobre nós mesmos, ou sobre quem pretendemos ser, do que nossa família. Perdemos tempo em auto-definições analíticas para poder elaborar um perfil na rede, mas não nos dispomos a sentar e ter uma conversa sincera com a avó, com o pai, com o irmão. Despendemos longas horas em frenesi virtual, querendo dizer tudo a todos, e muitas vezes mal conhecemos pessoas que convivem ou vivem conosco.


[Por mim mesma, K.]

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

- Eu preciso saber se é realmente possível que duas pessoas fiquem juntas para sempre, apaixonadas.

- O melhor que se pode fazer é encontrar alguém que a ame pelo que você é. De bom humor, de mau humor, bonita, feia, o que for. A pessoa certa continuará vendo raios de sol saindo da sua bunda. Esse é o tipo de pessoa com a qual vale a pena ficar.

[Filme Juno, 2007]

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Fanatismo bestial futebolístico

           Sei que esse texto vai doer em muita gente. Paciência. Os incomodados que se incomodem. Eles têm o direito de gostar de futebol, assim como eu tenho o direito de expressar o que penso. 
          Mas o mais [in]crível de toda a imbecilidade futebolística ainda não é os jogadores ganharem milhões verdadeiramente absurdos – o que em si já é uma total e bizarra desvalorização do trabalho e inteligência humanos. Também não é o fato dos fanáticos idolatrarem não mais do que um uniforme, uma combinação de cores – já que o “amor à camisa” virou literalmente amor à camisa apenas. Técnicos duram o tempo de um campeonato e ou são massacrados pela torcida – no caso da derrota – ou abandonam o time por um salário maior – no caso da vitória. Com os jogadores se passa o mesmo. Querem mesmo é prestígio pessoal e, claro, dinheiro, muito dinheiro, quantias monumentais de dinheiro. Mas não cometamos a injustiça de culpá-los por isso, quem não quer não é mesmo? Tudo se resume a uma pura dinâmica administrativa. Por isso, não critico aqui o esporte futebol, que inclusive acho legal como tantos outros esportes, critico o negócio futebol, mascarado de esporte.
            Enfim, o mais [in]crível e irônico mesmo, na minha opinião, é que a esmagadora maioria de torcedores de futebol sequer pratica o esporte. Mas... pão e circo ao povo! Digo, cerveja e futebol!


[Por mim mesma, K.]
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quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Breve receita de “sucesso” no mundo pós-moderno.

Finja felicidade,
Finja tristeza,
Finja interesse,
Finja indiferença.
Finja ser forte, finja ser fraco.
Finja simpatia, finja hostilidade.
Finja saber, finja ter, finja ser.
Finja ignorância.
Pareça cruel, pareça bonzinho.
E o mais importante: nunca deixe sua alma
escapar através de seus olhos,
ela pode acabar com seus planos,
e certamente o fará.
Denunciará sua real fragilidade humana,
e buscará a sinceridade das coisas.

[Por mim mesma, K.]
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quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Um amor urbano

É todo dia um novo começo,
um recomeço de tudo de novo,
de tudo de velho.
A música no ouvido, no coração.
O pulsar pulsante e estático.
O movimento imóvel
e o farfalhar do aço.
A ansiedade da partida,
a ansiedade da chegada.
A estada que se faz breve, breve demais.
O repousar noturno e os sonhos intranqüilos.
O sono que é pouco.
É todo dia um amontoado de sucedidos,
aos quais não nego sua devida importância,
os reconheço e os desejo.
Mas como podem esses tantos sucedidos
competir com a ternura do teu olhar?
O tudo parece nada.
Tu és o meu ninho, meu verdadeiro repouso,
e a simplicidade do nosso silêncio me é tudo.
E é como se esses tantos sucedidos
fossem uma contagem regressiva para meu retorno à ti.
E então, minha vida passa do sépia ao pleno colorido do amor.


[Por mim mesma, K.]

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sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

O processo da revolução

     Buenas. Eu não quero me perder aqui em debates teóricos nem nada do tipo. Meu intuito é trazer ao olho algo que está aí pra ser visto, mas que nem sempre percebemos de maneira sensível. A idéia me veio a partir do último filme que vi, "Danton: O processo da revolução". Também havia estudado o período no semestre retrasado, aí decidi fazer a conexão entre os dois e compartilhar.
     Todos sabem e citam a Revolução Francesa - 1789. Realmente foi algo de uma dimensão incrível e que mudou para sempre os rumos das relações políticas no mundo todo. Abriu caminho para uma série de transformações, sem dúvida. Contudo, teve sua índole corrompida. Na chamada fase do Terror (1793) - e ao longo de todo o processo, mas mais acentuadamente nessa fase - a revolução vira uma verdadeira tirania, e cabeças rolam por toda a França, nas guilhotinas, que encarnam verdadeiros símbolos de opressão e ameaça. Robespierre, principal líder do período, estava mais para uma Rainha de Copas: - Cortem-lhe a cabeça! O novo sistema deve se manter a qualquer custo! E todos que discordarem são acusados de crime contra a pátria, de atos contra-revolucionários.
     E não longe dali, depois de uma série de desacertos, alterações convenientes e contraditórias no ideário revolucionário e atos que desvirtuaram completamente o espírito da revolução, logo ali, em 1799, a monarquia retorna a França, sob uma forma militar e violenta, na figura de Napoleão Bonaparte. Repito: a monarquia retorna a França. Em 1799.
    O que quero com esse modesto e breve comentário acerca de um assunto tão complexo, é, simplesmente, mostrar que as coisas não são lineares como nos colocam, nem compartimentadas, fragmentadas. O buraco é muito mais embaixo. As mudanças demandam processos infinitamente complexos e longos, e isso é natural. É preciso que olhemos tendo em vista um horizonte mais amplo, e um pensamento mais crítico e inquisitivo.
     A seguir, coloco algumas passagens da primeira versão da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789. Lendo-as, entenderão o que eu quis dizer.


I - Os homens  nascem e permanecem livres e iguais em direitos; as distinções sociais não podem ser fundadas senão sobre a utilidade comum.

II - O objetivo de toda associação política é a conservação dos direitos naturais e imprescritíveis do homem; esses direitos são a liberdade, a propriedade, a segurança e a resistência à opressão.

III - O princípio de toda a soberania reside essencialmente na razão; nenhum corpo, nenhum indivíduo pode exercer autoridade que dela não emane diretamente.

IV - A liberdade consiste em poder fazer tudo que não prejudique a outrem. Assim, o exercício dos direitos naturais do homem não tem limites senão aqueles que asseguram aos outros membros da sociedade o gozo desses mesmos direitos; seus limites não podem ser determinados senão pela lei.

V - A lei não tem o direito de impedir senão as ações nocivas à sociedade. Tudo o que não é negado pela lei não pode ser impedido e ninguém pode ser constrangido a fazer o que ela não ordenar.

VI - A lei é a expressão da vontade geral; todos os cidadãos têm o direito de concorrer, pessoalmente ou por seus representantes, à sua formação; ela deve ser a mesma para todos, seja protegendo, seja punindo. Todos os cidadãos, sendo iguais a seus olhos, são igualmente admissíveis a todas as dignidades, lugares e empregos públicos, segundo sua capacidade e sem outras distinções que as de suas virtudes e de seus talentos.


XI - A livre comunicação dos pensamentos e opiniões é um dos direitos mais preciosos do homem; todo o cidadão pode, pois, falar, escrever e imprimir livremente; salvo a responsabilidade do abuso dessa liberdade nos casos determinados pela lei.

XII - A garantia dos direitos do homem e do cidadão necessita de uma força pública; essa força é então instituída para vantagem de todos e não para a utilidade particular daqueles a quem ela for confiada.


XV - A sociedade tem o direito de pedir contas de sua administração a todos os agentes do poder público.



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