terça-feira, 1 de janeiro de 2008

Louca-feira.

Sexta-feira é o dia louco da semana, o maior de todos ao menos. Todos com pressa, todos vivendo. Uns batucando aqui, outros remexendo acolá, distraindo os cérebros para não pensar. O motorista do ônibus é quase um assassino por inúmeras e incansáveis vezes, vítima da fúria de uma sexta-feira.
A lotação recebe o mérito de ser chamada “lotação” com seus passageiros loucos, em uma sexta-feira louca, como não podia deixar de ser. Quase mal dizendo a lógica ao agregar tantas pessoas quanto não podia.
Há sempre os tipos característicos. Aqueles homens que passam esfregando seus bagos com orgulho em qualquer ninfeta ou senhora com quadris pomposos ou de agrado deles. Mulheres gordas que falam alto, como se sua voz fosse proporcional ao resto do corpo. Moças contando dramas românticos pelos quais passaram ou estão a passar recentemente, como se todo mundo pudesse e quisesse saber de sua vida. E, claro, há sempre uma família, completa, vinda de uma festa de aniversário no pior horário possível em uma sexta-feira louca. Com direito a balões, sacolas, salgadinho fedorento, crianças barulhentas e cretinas e mulher descontrolada. Há ainda um bebê, sempre há um bebê, em algum lugar que começa a chorar sem parar por algum motivo. E por mais que se tenha consciência de que os bebês muitas vezes são pedacinhos de carne graciosos, fofos e tudo mais, nem por isso deixamos de sentir vontade de torcer o infeliz que não pára de gritar, é simplesmente enervante.
E no sacode-sacode, como não poderia deixar de ser, o frenesi de aromas começa a se estabelecer. Há homens de meia idade, ou de idade e meia, com seus hálitos de cachaça que chegam a tontear. Há aqueles que economizam não só no perfume, mas como também no banho. Resultado de um dia cheio no trabalho ou de falta de higiene? Há aqueles que exageram nas essências industrializadas e fazem com que seus perfumes caros acabem se misturando a aromas indignos como, por exemplo, flatulências descaradas.
As curvas parecem gigantes. Os gritos, os sacolejos, tudo é nervoso e constante, tudo na sexta-feira louca, pois não poderia deixar de ser...
Mas os destinos acabam chegando para todos, para uns mais cedo do que para outros, mas de qualquer maneira, todos descem da lotação deixando um pedaço de si, um pedaço da sua vida, breves momentos que, como todos, não voltam mais...
(15.07.2006)

[Por mim mesma, K.]

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