sexta-feira, 29 de abril de 2011

If not now, when? - 2011

Consegui este álbum através de um amigo. Ele ainda não foi lançado oficialmente, o que acontecerá apenas em julho deste ano. Estão lançando os singles por enquanto. Ontem, lançaram o 'Adolescents'.  Está difícil de baixar, pois a fiscalização tá ferrenha e os links duram muito pouco. 
Mas enfim, desde ontem que não consigo parar de ouvir este disco. Em certo sentido é um disco bastante diferente do restante do trabalho da banda. Pra quem ouviu o Light Grenades (2006) e, como eu, também achou um disco ostensivamente produzido, vai perceber que o If not now, when? retoma uma originalidade mais sensível da banda, mostrando um trabalho genuíno. Chamam a atenção elementos que deixam perceber influências claramente oitentistas, entre outras, claro. Brandon Boyd, também surpreende com seu vocal, que sem dúvida encontra as expressões de inovação e de perfeição extrema neste álbum. Então, pra quem tiver afim de ouvir música boa e NOVA - porque tem uma galera imensa por aí que não sabe admirar a arte do seu tempo e professa aos quatro ventos que só o passado é que era bom - tá aí a dica mais do que bacana. Aproveito para agradecer, mais uma vez, ao meu amigão Ed, que me passou o disco!

Link do site oficial da banda:
http://www.enjoyincubus.com/us/home

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terça-feira, 26 de abril de 2011

Para sempre...

Chovia dentro de seu coração. Uma chuva que caia em sentido inverso, contra a gravidade, e desaguava em seus tristes olhos. Seu corpo estava doente, seu espírito estava doente. Fora condenada. Tinha agora os pensamentos confusos. Lembrava-se de que para muitos sua doença era considerada um dom, sua maldição, uma bênção. Tolos, não haveriam de compreender a infinita beleza da efemeridade e fragilidade humanas. Mas não podia culpá-los, pois só agora também tinha os olhos despertos para ela, através da mágoa do intocável, do impossível, do imutável.
Sentia seu corpo fraco e com fome. Dias já haviam se passado desde que fora transformada e determinara-se a não se alimentar, negando-se a qualquer tentativa de seus “anfitriões”.
Olhava agora, de maneira quase inanimada, para o tapete brilhante no chão. Talvez pela primeira vez, percebe o lugar onde está. O cômodo da casa que lhe fora destinado é um lindo quarto, bastante confortável e elegante. Porém, não há janela alguma, o que torna o espaço um tanto opressor.
Em todo esse tempo, não comera, não bebera, não se banhara. Limitara-se a ficar estática sobre a cama, numa desgraçada resignação. Também foram poucos seus momentos de descanso, seus pequenos fragmentos de sonos mais pareciam delírios de febre. Encontrava-se ali, pois, uma figura sombria e terrivelmente degradada pelos últimos acontecimentos. Não ousara aceitar o fato. Negara, desesperara-se, mas em nenhum momento até então havia olhado para o futuro com olhos que agora tem, os olhos de um vampiro.


[Por mim mesma, K.]

Civilidade inventada

A boa educação, a gentileza e o respeito ao próximo estão definhando sob os pés da grosseria descabida, do egoísmo mascarado, da alienação velada, de uma manada urbana que em nada se assimila à ordem tão singela, mas inerente, demonstrada por outros animais ‘não racionais’ e ‘não civilizados’.



[Por mim mesma, K.]

terça-feira, 19 de abril de 2011

Eloqüente, mas furado!

Os discursos inflamados, que pregam as revoluções, que clamam por mudanças. Discursos que volta e meia pipocam febrilmente num modismo vazio ao longo da história. Esses discursos muito pouco ou quase nunca saem da boca daqueles que são propriamente o objeto da fala. Talvez por isso, esses discursos nunca encetem ou inspirem mudanças verdadeiras e permanentes. Não são genuínos e obedecem, via de regra, mais a uma tendência sazonal do indivíduo do que a um desejo coletivo de superação. Nunca querem desbestializar os bestializados. É preciso que a besta continue existindo, alimentando os discursos pomposos de uma elite burguesa que nada sabe da vida para além das teorias livrescas. Esses discursos alheios da realidade nunca chegam ao cerne de qualquer questão. São adereços que figuram na prateleira, junto das roupas que encarnam o personagem preocupado, estiloso e, sobretudo, descolado, - bem ao lado daquilo que conhecemos como hipocrisia.



[Por mim mesma, K.]

quinta-feira, 14 de abril de 2011

Beleza comprada

A profusão absurda, em nossos dias, de centros de beleza, estéticas e afins, fala muito mais do que gostaríamos de admitir sobre as preocupações e prioridades de nosso tempo.







[Por mim mesma, K.]

segunda-feira, 11 de abril de 2011

Manifesto da solidariedade privada:


A minha solidariedade é finita e condicional. Sem falsos altruísmos, sem hipócritas filantropias, sem  qualquer generosidade egoísta. A minha solidariedade não se submete a insensatezes alheias, nem a qualquer estupidez torpe e medíocre. Também não está para ações bestiais infundadas, ou atitudes pouco ou nada refletidas. Minha humanidade se reserva para os espíritos verdadeiramente humanos, para aqueles que não se curvam aos boçais instintos animais, sejam eles os primitivos primevos ou os neo-primitivos mascarados por uma modernidade decadente. Não, minha solidariedade é minha, e faço dela o que bem quiser, ou não faço nada. Distribuo a quem eu quiser, e considerar merecer, podendo ser nas formas mais variadas, emotivas ou físicas, anônimas ou declaradas. Minha solidariedade é minha e não deve demagogas satisfações à ninguém.


[Por mim mesma, K.]

quinta-feira, 7 de abril de 2011

Sobre os casais de plástico

Há casais famintos por alcançar datas de aniversário do relacionamento. Usam-nas numa tentativa desesperada de renovar esperanças que já não mais existem, há tempos. Geralmente as expressam por meio de trocas de presentes, desprovidas de qualquer sentido mais profundo. Há ainda aqueles que 'saem' pra fazer 'algo especial' no intuito de sublinhar a ocasião. Saem, comem, mostram-se, exibem-se para os outros num desfile curioso, num arremedo competitivo e velado. Esforçam-se por fazer saber aos outros que estão juntos ainda - e felizes, muito felizes. 'Viu, como deu certo?' ‘Viu? Consegui!’. A passagem numérica do tempo é o único argumento que encontram para explicar uma felicidade obrigatória que, no fim de contas, não está lá. O tempo é o único poder de legitimação desse amor vazio de sentido.
Não estou aqui falando de todos os casais, nem mesmo da maioria talvez, mas tenho visto por aí alguns exemplos claros de pessoas que não têm absolutamente mérito ou sentimento nenhum em manter um relacionamento. Dão-me a impressão de que em qualquer pessoa que se tivessem escorado, ali permaneceriam até o fim de suas vidas, sem muito esforço, vítimas de uma carência desmedida e pobres de auto-estima. Reitero e complemento um velho ditado: antes só do que mal amado, ou do que mal amante.
Dessa insistência teimosa e despropositada, advêm as traições, as insatisfações, as frustrações, e toda essa balela que a gente já está careca de saber, de homem é assim, mulher é assado.  
As pessoas fazem tudo, mas é sobre muito pouco - ou quase nada - do que fazem que se perguntam sobre os verdadeiros sentidos e desejos. Perpetuam hábitos e costumes que nem mesmo refletem a si mesmos, se é que algum dia refletiram...


[Por mim mesma, K.]

terça-feira, 5 de abril de 2011

A morta

[...] 
Não havia lua! Que noite! Sentia medo, um medo horrível, nesses caminhos estreitos entre duas filas de túmulos! Túmulos! Túmulos! Túmulos. Sempre túmulos! À direita, à esquerda, à frente, à minha volta, por toda parte, túmulos! Sentei-me num deles, pois não podia mais caminhar, de tal forma meus joelhos se dobravam. Ouvia meu coração bater! E também ouvia outra coisa! O quê? Um rumor confuso, indefinível! Viria esse ruído do meu cérebro desvairado, da noite impenetrável, ou da terra misteriosa, da terra semeada de cadáveres humanos? Olhei à minha volta!
Quanto tempo fiquei ali? Não sei. Estava paralisado de terror, alucinado de pavor, prestes a gritar, prestes a morrer.
E, de súbito, tive a impressão de que a laje de mármore onde estava sentado se movia. Realmente, ela se movia, como se a estivessem levantando. Com um salto, precipitei-me para o túmulo vizinho e vi, sim, vi erguer-se verticalmente a laje que acabara de deixar; e o morto apareceu, um esqueleto nu que empurrava a lápide com as costas encurvadas. Eu via, via muito bem, embora a escuridão fosse profunda. Pude ler sobre a cruz:
"Aqui jaz Jacques Olivant, morto aos cinqüenta e um anos de idade. Amava os seus, foi honesto e bom, e morreu na paz do Senhor."
O morto também lia o que estava escrito no seu túmulo. Depois, apanhou uma pedra no chão, uma pedrinha pontiaguda, e começou a raspar cuidadosamente o que lá estava. Apagou tudo, lentamente, contemplando com seus olhos vazios o lugar onde ainda há pouco existiam letras gravadas; e, com a ponta do osso que fora seu indicador, escreveu com letras luminosas, como essas linhas que traçamos com a ponta de um fósforo:
"Aqui jaz Jacques Olivant, morto aos cinqüenta e um anos de idade. Apressou com maus tratos a morte do pai de quem desejava herdar, torturou a mulher, atormentou os filhos, enganou os vizinhos, roubou sempre que pode e morreu miseravelmente."
Quando acabou de escrever, o morto contemplou sua obra, imóvel. E, voltando-me, notei que todos os túmulos estavam abertos, que todos os cadáveres os tinham abandonado, que todos tinham apagado as mentiras inscritas pelos parentes na pedra funerária, para aí restabelecerem a verdade.
E eu via que todos tinham sido carrascos dos parentes, vingativos, desonestos, hipócritas, mentirosos, pérfidos,caluniadores, invejosos, que tinham roubado, enganado, cometido todos os atos vergonhosos, abomináveis, esses bons pais, essas esposas fiéis, esses filhos devotados, essas moças castas, esses comerciantes probos, esses homens e mulheres ditos irrepreensíveis.
Escreviam todos ao mesmo tempo, no limiar da sua morada eterna, a cruel, terrível e santa verdade que todo mundo ignora ou finge ignorar nesta Terra. 
[...]

Trecho de "A morta" de Guy de Maupassant.

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